Psicanálise em positivo – entrevista com Chaim Katz
Um pensamento inquieto, sem paradeiro. Uma fidelidade radical ao psicanalítico. A contundência de posições muitas vezes inusitadas. Presença em movimentos. A coragem do enfrentamento permanente com o que petrifica e congela. Tudo isso leva o psicanalista Chaim Samuel Katz a uma fecunda produção, onde a psicanálise se espraia, se dobra e desdobra,
vibrando ininterruptamente, buscando personagens muitas vezes escondidos, apagados pelo pensamento cristalizado de instituições já empedernidas em seus automatismos repetitivos.
Assim é esse mineiro que virou carioca, que sempre teve a coragem da busca da criação, em circunstâncias algumas vezes fecundas, outra vezes perigosas.
No semanário Opinião, em plena vigência do Ato Institucional nº 5, década de 70, juntamente com pensadores que lutavam contra a repressão militar (Paulo Francis, Millor Fernandes, entre outros), Chaim era presença constante. Era quase uma voz única no campo da psicanálise a se manifestar politicamente. Chaim nunca ficou calado. É figura polêmica, amado e odiado por esse Brasil afora.
Sempre antenado no que vai pelo mundo, foi um dos que introduziram o estruturalismo no Brasil. Leu Lacan antes de muita gente. Para hoje contestá-lo: Chaim é crítico radical dos grupos lacanianos. Estudou filosofia – é discípulo fiel de Claudio Ulpiano – foi amigo de Foucault, Leclaire, leitor assíduo de Deleuze e Guattari. Sempre nas bordas, Chaim traduziu Tauski, mergulhou em Ferenczi, trabalha com a psicose.
Publicou inúmeros livros, dos quais citamos alguns: Ética (Graal, 1984), Psicanálise e Nazismo (Taurus, 1985), Freud e as Psicoses (Xenon 1994). Organizou outros tantos, dos quais também citamos apenas alguns: Psicanálise e Sociedade (Interlivros, 1977), Temporalidade e Psicanálise (Vozes, 1995). Sempre buscou reunir pensamentos diversos em leques que se abrem para pertinências distintas, marcando sua oposição a qualquer dogmatismo. Fundou a Formação Freudiana, pois, afirma nessa entrevista, “vivemos todos institucionalmente.” Ou seja, encara o paradoxo, não se furta ao conflito. E assim é sua clínica.
A entrevista com Chaim Samuel Katz foi feita através da troca de e-mails. Um “diálogo indireto” como ele mesmo afirmou. Perdemos todos com isso, pois não pudemos discutir nem rir juntos. Mas, assim foi. E, as espirais do pensamento de Chaim brotaram em sua escritura. Pelos seus redemoinhos fomos indo, todos nós. E, das muitas ventanias em que tantas vezes nos perdemos, surgiu essa paisagem, rica e acidentada. Vale a pena a viagem.
Miriam Chnaiderman
Entrevista retirada da Revista Percurso
Realização e edição: Andrea Carvalho, Bela Sister, Daniel Delouya, Mara Selaibe, Miriam Chnaideman, Patricia Getlinger e Sidney Shine.
Chaim Samuel Katz: Experimento responder as perguntas tais como postas. Tal diálogo indireto nos fará diferença, o que me interessa, mas apontando excessivamente para oposições polarizadas, ausentando-se uma fina mediação, que merece(ria)mos todos. Contudo, é no campo psicanalítico que nos é comum que me sinto convidado e comento.
Percurso: O Sr. tem se mostrado, ao longo dos anos, um crítico perspicaz das instituições. Gostaríamos de saber o que o motivou a fundar a Formação Freudiana. Poderia descrever um pouco suas propostas, diretrizes e inserção no meio psicanalítico?
Chaim: Podem-se criticar situações, posições, articulações (etc.) institucionais. A não ser algum Zaratustra, entre os seus trinta anos e a descida das montanhas dez anos depois, vivemos todos institucionalmente. Sabemos das diferenças, irredutíveis, entre instituído e instituinte; porém, uma crítica institucional se faz de algum lugar e temporalidade, com linguagem que é, queira-se ou não, instituída ou a instituir. Instituídas, na paixão do que é, instituintes no que devêm, desapaixonadamente. Será isto inseparável da “fundação” de alguma coisa, ao menos de um grupo psicanalítico?
Chamar colegas para fundar a FF: instituir uma pertinência comum, pensar e elaborar uma psicanálise ligada à vida e à dignidade (Kant), retomar os fracassados e os vencidos da psicanálise; também procurar, enquanto coletivo, direitos sociais e organizacionais e uma arregimentação de mercado que não existem de modo espontâneo. Tocar de modo instituído nos regimes teórico, clínico, afetivo e social, passar junto com outros pelo ser comum, a psicanálise, tal como elaborada (também nas suas dificuldades) por Freud. Produzir a diferença no campo psicanalítico e elevar o trágico.
O meio psicanalítico é heterogêneo; inexiste sem seus componentes. Quando nos afirmamos, ele se opõe, defendendo-se (no estrito sentido freudiano). Se podemos forçar encontros, somos. A FF, como não tinha e nem tem um nome-chave para significar suas direções teóricas e organizacionais, sofre muitas dissensões e mantém uma tendência demasiado individualista, excessivamente instituinte e, às vezes, anárquica, por falta de hierarquia e pensamento mais definidos.
Mas algumas dessas diretrizes que indiquei acima estão muito vívidas e insistentes; penso que elas não fazem parte do “comum” dos psicanalistas da cidade. De algum modo, tornam-nos também koinonia (comunidade), elaborando-nos assim, na medida em que nos auto-poetamos. Por exemplo, elaboramos durante este ano, 1999, acerca de alegria e felicidade na psicanálise, que termina com um pequeno (mas “cumpridor”) fórum. Distante e diferente dos reprodutivos mal-estar e desamparo ontológicos dos psicanalistas que tentam deter vidas, inconscientes e congressos. Dá para persistir assim? Por quanto tempo? A FF tem questões mais graves do que a palavra “fundação” pode admitir.
Percurso: O contato que o Sr. tem com outros pensadores além de Freud, e não só psicanalistas (o Sr. tem um amplo percurso dentro da filosofia), aparece tanto nos seus textos mais teóricos, na leitura que o Sr. faz de Freud, quanto na sua clínica. O seu percurso passou por Lévi-Strauss (que o Sr. traduziu), Lacan (que o Sr. conheceu antes de muita gente aqui no Brasil), Leclaire (de quem o Sr. se tornou amigo), Deleuze, Lévinas, Ferenczi etc. O Sr. poderia explicitar mais de que forma esse caminho está presente em seus textos e no seu trabalho clínico?
Chaim: Tenho um percurso intenso de pensamento e vivência de esquerda não partidária. Por isto, para mim (e para a maioria dos colegas que continuam na FF) – psicanalisar é também experimentar modificar a vida e não apenas pensar discursos e articular estruturas e organizações psíquicas. Isto me colocou em direções de pensamentos menos tradicionais na psicanálise. Assim, para a clínica e o pensamento, os detalhes são centrais para este “fazer psicanálise”. Não saberia dizer que organização e filiações teóricas exatas produzem tal psicanálise, mas a perturbação e preocupação com os outros, o fazer-se outro e suportar diferenças indicam uma direção e convergência no fazer psicanálise.
O Sr. N. vem me procurar, depois de uma experiência de vinte anos com outros psicanalistas. Dois meses depois tem uma crise psicótica, despe-se e corre nu por movimentada avenida carioca. É internado; sente-se envenenado na clínica psiquiátrica e desassistido por mim; mas é assim que continuamos o tratamento. Os métodos dos três colegas anteriores não o convenceram, mas ele insiste em se analisar, apesar de não compreender quase nada do que eu falo ou reflito. Ou seja, há transferência positiva, com a psicanálise: o que ele soube nas análises anteriores foi muito proveitoso. Observo que traz fragmentos de interpretações para se considerar e (re)construir; elabora parcialmente suas terríveis paranóias lembrando-se de alguma fala importante de um dos três psicanalistas. Algo como “quando era pequeno, minha mãe dizia que eu era vagabundo. Atualmente, faço listas intermináveis de tarefas que jamais cumprirei e cujo exercício é sumamente penoso. Contudo, é assim que, na minha preguiça atual, volto a ser criança e recebo reprimendas de mim mesmo. O psicanalista X. disse que isto me deixa mal, mas amparado. Por isto faço listas de tarefas que não cumprirei; sou preguiçoso, mas conservo o relacionamento com minha mãe severa”. O que, como ensinou Freud, tende a se repetir enquanto vivência, reprodução do mesmo; mas mostra que as interpretações das análises anteriores, que à época também não lhe eram inteligíveis e lhe causavam horror e repúdio, são elementos importantes atuais para sua organização psíquica, sua tentativa de sair da factualidade reprodutiva. São o que eu chamo de “eventos descobridores” (que sei produzir, enquanto técnica analítica especial) de mudança expansiva, pois só passam a se constituir enquanto marcos de referência no regime transferencial; são “pequenos édipos”.
Na minha técnica com melancólicos denomino tais produções, para facilitar minha nomenclatura, de recordações encobridoras produtivas, cuja função é dar sentido e arregimentar dispersão. Desacredito na pesquisa de rememoração infantil com um melancólico, pois o infantil é o que ordena agora sua organização psíquica. Trata-se, então, de criar um evento infantil descobridor e não procurar fatos na infância. Por exemplo, Maurício, melancólico há quatro anos em análise, levou uma batida de carro, por detrás, de uma jovem que se fazia acompanhar de seu pai, militar severo. Depois de muita discussão sobre o autor culpado do acidente, filha e pai concordaram em pagar pouco mais da metade do prejuízo (segundo cálculos de Maurício). Tal fato se eventualiza, transferencialmente, como “mais da metade”, tarefa até então impossível, pois era produzida enquanto fato, sempre substituído pelo choro desesperado que expressa a ausência de uma memória de infância. Sua verificação de operações diferentes de “nada” ou “tudo”, se marcará como descobertas, criações, doravante inapagáveis. Esta é uma das técnicas analíticas especiais, pois não se usam com todos os analisandos, nem se insistem demasiado com o próprio Maurício. Mas se tornam, enquanto acontecimento, memória infantil dele, possibilitando, doravante, recordações fatuais. Observo que não se trata de dizer: “Você já pode fazer mais da metade.”, dirigindo-se ao seu eu, ou “Agora fale de outra coisa”, postando-se como seu Outro, mas se trata de insistir no infantil. Esta técnica segue, rigorosamente, o ensino de Freud sobre as recordações encobridoras.
A abordagem do Sr. N. é outro exemplo, e não vale para qualquer análise. Contudo, trata-se, insisto, de situações parciais, valiosas, embora restritas. Qual a função do psicanalista? Além da construção de produção psíquica de seus analisandos, o que se trata é de “me” (enquanto psicanalista) fazer inteligível. O que é uma mistura bem dolorosa. No caso do senhor N., qual o caminho para metá, hodós (método, caminho-para)? Na introdução e comentário de falas “iguais” às que ele já deve conhecer, na feitura de re-conhecimentos (não hipócritas, segundo Ferenczi), ecos de suas próprias falas, comentários epidérmicos aos seus discursos nas suas especificidades e singularidades, evitando grandes diferenças de significação. O profundo é a pele (eis o que aprendo com Klein. Na psicanálise, quem trabalhou com a superfície e, simultaneamente, com as tripas (segundo Lacan), foi Melanie Klein. Diferente do simbólico de Valéry (“O mais profundo é a pele”), ela toca nas bordas instintuais e não nos destinos profundos da inteligência. (Ou me engano com Valéry, que não conheço o suficiente?).
Essas falas, então, ele pode ter como suas agora, enquanto a análise se faz e dura (cada seis meses ele “termina de vez” a análise), que ele introjete e projete tais “comentários” transferencialmente, elaborando um si consistente, um “próprio”, um Selbst (o si é uma conjunção/disjunção de vários registros e se mantém nas fronteiras corporais, no encontro de corpos) que faça sentido ao reconhecer os outros e ser por eles reconhecido, pois tem um interlocutor transferencial para tal. Neste caso, o detalhe não é fazer significação, instalar-se num campo edípico único com suas constituições previamente delineadas, produzir uma nova narrativa mítica, mas permitir o sentido ali mesmo onde ele incide e se repete sem re-conhecimento próprio. Evitando a dispersão e a perseguição excessivas, delas participando como um outro que está de acordo, a quem o Sr. N. pode “compreender”: é por aí que se faz outra vivência e uma nova produção inconsciente.
Devo dizer que sou obrigado a conduzi-lo ativamente para a dissensão, deixando sua incompreensão e o mal estar durarem. Quando ele retoma o assunto (e sempre o faz, para mostrar que não sirvo para ser seu analista interlocutor, pois sou alguém que fala numa língua incompreensível) nunca me interesso pela significação, mas (neste caso) pela briga silenciosa, não declarada, pelo fazer sentido, por seu contato com a alteridade. Suportamos diferenças em torno de assuntos os mais banais, o que o coloca num plano menos dispersado. Ou seja, ferenczianamente, fazer da assim chamada transferência negativa um elemento positivo e comum entre analisando e psicanalista. O que se consegue, com muita dificuldade e permanentes frustrações enquanto psicanalista “perspicaz”. E que foi permeado por um acidente notável: uma única vez, depois de muito ameaçar fazê-lo, o Sr. N. retirou um revólver de sua inseparável bolsa esportiva, gritando desesperadamente que mataria todos os que o ameaçavam (“todos”, ali na sala, era eu).
Nesta perspectiva, ser psicanalista, clinicamente pensando, é construir com e na teoria, mas não interpretar teoricamente, é surpreender a sexualidade e as diferenças sexuais, que estão em situações e produções as mais insólitas. E persegui-las, onde se mostram passíveis de fazer sentido, e não onde podem significar para a teoria prévia do analista e da psicanálise.
Percurso: O Sr., muitas vezes em seus textos, se opõe à teoria lacaniana quando ela se apresenta feito um modelo psicanalítico unitário. Mas não se reporta tão freqüentemente a outros tantos modos, também contemporâneos, de conceber e operar a psicanálise – seja para criticá-los seja para utilizá-los – nascidos das experiências e do pensar de analistas tais como Klein, Winnicott, Bion; ou ainda Green, Fédida, Aulagnier, Le Guen, Kernberg, Khan, Bollas, Meltzer, Kohut, Storolow e tantos outros; ou mesmo a autores brasileiros como Melsohn e Herrmann. Não estaria o Sr. na maneira como constrói sua crítica, sendo um dos que unifica e reifica a seara analítica se reportando – ainda que para criticar –apenas à concepção trazida por Lacan e seus discípulos diretos?
Chaim: A oposição a Lacan e, especialmente, ao lacanismo que conheço de perto, se deve, especialmente, a dois fatores. Lacan pensa e escreve numa linguagem sustentada por um saber filosófico tradicional e suas conseqüências (primeiro Hegel-Kojève e depois Heidegger), que ignora as vicissitudes das pulsões (essenciais na produção de Freud), e do pensamento que procura modificar a vida, procurando-lhe mais expansão (o que é apenas ser diferente). Promete e obriga um regime de totalização, por mais diferente que sejam seus pensamentos (por exemplo, da intersubjetividade e um outro, da primazia do Real), onde só ele, JL, encontra e sabe (o que exclui quem não diz o mesmo). Em segundo, pois o lacanismo brasileiro, ao menos aqui no Rio de Janeiro, levando esta teorização totalizante e totalitária a extremos desconhecidos na história da psicanálise, não admitindo diferenças no interior da psicanálise, se impôs com violência sobre esta multiplicidade de psicanálises que vocês indicam, ignorando qualquer pensador que não caminhe na direção de significantes, grande outro, nome do pai, etc.
Vejo, neste momento, um modelo desta violência: o edital de abertura de inscrição para seleção de candidatos para o Curso de Mestrado em Pesquisa e Clínica em Psicanálise da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ, uma universidade pública!), que diz, nas suas “Observações 4”, que a língua estrangeira aceita é unicamente “prova de proficiência em língua francesa”. Ou seja, quem conhece apenas alemão dançou nesta, pois o único Freud bom é o gálico e a psicanálise que se ensinará no mestrado é a psicanálise lacaniana. Bem como nos concursos universitários públicos ou privados, para vagas de professor, não se escapa desta regra: ou se fala o jargão linguageiro ou não se é psicanalista e se é desclassificado. O que vocês também devem saber, melhor do que eu, é que a maioria dos psicanalistas lacanianos considera os outros psicanalistas como psicoterapeutas ou psicólogos, o que nos coloca, a todos deste “papo”, fora do mundo de suas idealidades e circulação.
Ora, para mim, na medida em que me sinto “tratado” com relação ao mundo das idéias, quando me empurram para fora de minha positividade, trata-se também de psicanálise e acolho tais produções políticas enquanto atos psicanalíticos. Assim, se estar referido especialmente a quem te pretende proibir enquanto psicanalista é reificar, aceito o termo lukacsiano: “eu” (quem?) reifico.
Analisando os três maiores modelos de constituição de “sociedades” psicanalíticas, procurei estabelecer num livro ainda em 1984, que o mais totalitário e pervertido é o que se organiza pelo primado da linguagem articulada unitariamente, que termina obrigando os psicanalistas a falarem uma nova-língua. Perdoem-me os colegas entrevistadores, mas acho que inexiste vita bella em campos de concentração e inclusões e exclusões brutais. Os analistas têm que considerar que quando um grupo começa a não suportar diferenças, querendo a hegemonia exclusiva de seu saber e poder, quando este grupo ganha o poder e exerce seus Diktaten, como acontece em quase todas os cursos de pós-graduação das universidades e faculdades do Rio de Janeiro, imaginar que seu pensamento deve ser esclarecido como qualquer outro dizer e pensar (tal equidade se supõe no vosso questionamento: Klein, Winnicott, Fédida, Aulagnier = Lacan!) ora, é ignorar o poder e o exercício de apagar diferenças, é postular uma neutralidade inexistente da vida digna e do saber.
Alguns de vocês também devem ter passado pela luta que permitiu aos psicólogos exercerem a psicanálise. Sabemos que a IPA impôs, ao menos, dois projetos na Câmara de Deputados, onde se queria, além da exclusividade do diploma médico para a atividade psicanalítica, a legalização das sociedades psicanalíticas apenas por sua pertinência internacional a Londres. Ainda me lembro de uma circular da SBPRJ que dizia aos seus psicanalistas que quando um psicólogo manifestasse, em sessão, seu desejo de se tornar analista, que isto fosse interpretado como resistência. Pergunto-vos: se tal lei tivesse sido aprovada, quantos de nós estaríamos psicanalistas? E uma tal luta é menos importante do que a elaboração pertinentemente teórica? Pólemos pánton mén páter estí… (Heráclito, fragmento 53: A luta/guerra é o pai de todas as coisas…).
Quanto aos autores cujas citações vocês pedem, nem todos estão presentes nos meus escritos, mas boa parte o está nos seminários, falações, supervisões. Garcia-Roza escreveu que sou “um dos raros autores nacionais que lêem autores nacionais”. Estaria ele enganado? Para lembrar um exemplo próximo: Isaías Melsohn foi meu convidado num simpósio sobre o trágico na FF (onde, aliás, sua contribuição foi brilhante), o que significa que já conhecia e elaborava seus trabalhos. Leio e conheço, muito bem, o que pensa Renato Mezan. Contudo, meus escritos não se dirigem na direção que me propõem, de citar e cotejar todos os que me impulsionam. Não sei como corrigir (e nem quero fazê-lo) tal “defeito”.
Percurso: Há uma coerência, para alguns, entre a personagem, o estilo e o trabalho Chaim Katz e o fato de que ele, mais do que outros, tem resgatado, discutido e aprofundado para o leitor brasileiro a contribuição de autores “marginais” contemporâneos a Freud (como Ferenczi, Tausk, Spielrein, Fenichel, entre outros), para a obra deste e à psicanálise, em geral. Gostaríamos de ouvir o que o Sr. tem a dizer sobre esta relação.
Chaim: Ninguém é suficientemente crítico de si próprio, ainda mais marginalizado. O que, naturalmente e seguindo Gödel, me inclui. Que o avaliem outros. Apenas acrescento à vossa pergunta, que procuro elementos em teorizações diferenciadas que me ajudem na produção de questões clínicas as quais consideram especificamente a alteridade, enquanto psicanalista freudiano no interesse pela cura, pela modificação e eliminação dos sofrimentos humanos excessivos (e se trata aí de uma deflexão judaica do meu pensamento, que assumo sem ter o que fazer com ela teoricamente). Isto não se separa da busca do conhecimento através da afirmação pulsional, na medida em que ambas as procuras convergem, segundo acredito. Merecerei um novo cherem (excomunhão da sinagoga judaica, ato que vitimou Espinosa)?
Percurso: Poder-se-ia afirmar que é por aí que se esboça, em seu trabalho, uma nova teoria da clínica? O Sr. poderia discorrer brevemente sobre ela ?
Chaim: Uma “nova teoria da clínica”? Finalmente um psicanalista brasileiro abordaria tão brava questão… Agradeço a pergunta, mas não perfaço tais condições. Respeitando os limites espaciais desta entrevista, acho que situei alguma questão (Frage, no sentido heideggeriano; modificação da vida, no sentido chainiano) no comentário à segunda pergunta. Tenho algumas considerações detalhadas. Atendo uma clínica mais diferenciada psicanaliticamente, claramente “perturbada”, sem muitos “candidatos” à formação (a FF não exige análise com seus membros), com depressivos, psicóticos, alcoólatras, drogados, os chamados borderlines, melancólicos, e tive que desenvolver outras vias de inclinação. Tal demanda gerou uma clínica com percursos mais estreitos, exigente com a expansão vital, ativa por referência aos chamados dos analisandos e próxima da urgência dos pedidos. Uma “nova” teoria?
Percurso: A que o Sr. se refere quando diz “sentido heideggeriano” e “sentido chainiano”?
Chaim: Heidegger, desde sua Ontologia Fundamental, quer saber o que pode o pensamento e o que se pode enquanto pensador (o que muito me importa). Colocar as coisas em questão, diz ele, pois só daí se podem fazer perguntas verdadeiras, desveladoras do Ser, pois conduzidas pela sua experiência. E eu, de acordo com Freud, Espinosa e outros, penso que a psicanálise pode e pretende modificar a vida, expandindo-a; a psicanálise não se presta apenas a descobrir uma (pretensa) lei do inconsciente.
Percurso: Observamos em sua obra que o Sr. enfatiza as raízes instintuais das pulsões ao invés do representante da pulsão. Poderia nos falar um pouco mais sobre isso considerando, também, além do aspecto metapsicológico, a clínica cotidiana?
Chaim: Certa noção contemporânea de pulsão desliga um dos seus componentes ou movimentos – a emergência somática – de sua constituição. Desconhece a imanência dos processos pulsionais. Como modificar psicanaliticamente um sujeito morto, eis uma pergunta interessante. Dando-lhe vida simbólica: linda piada hegeliana, à qual não dou demasiado importância. O humano como real do Espírito Absoluto, o que anula os acontecimentos (das Ungeschehenmachen) como bom obsessivo e seu super-oposto, que produz a vida humana onde ela já não é! O simbólico como Wiedergeschehenmachen, como o tornar a fazer, produzir desde a cadeia simbólica (trata-se de um termo meu, para marcar o traço totalitário de certas linhas simbólicas).
Para Freud e para mim, no caso dos sujeitos que nos procuram, sem Quelle (a fonte, uma das quatro características da pulsão segundo Freud) não há pulsão. Mortos não se traumatizam. Quando Ferenczi produziu a teoria da introjeção e projeção, belo instrumento psicanalítico para pensar a emergência dos incorporais, nem se incomodou em dizer que isto se passa apenas com os viventes. Mortos podem ser inscritos na memória e em algum sistema simbólico, mas não introjetam, nem pedem para se analisar. Conheço analistas defuntos, mas nenhum analisando morto pedindo análise. Quanto ao cerne da pergunta, o que se chama de representante pulsional está exatamente ligado à crença de um complexo universal no humano. O que vocês chamam de “raízes instintuais” diz que os incorporais se fazem de muitos lugares. Insisto: se não se constituem sujeitos sem representantes da pulsão, também não há sujeito sem raízes instintuais. Negar isto seria postular um aparelho psíquico unitário, com uma memória única, equilibrada a posteriori (nachträglich), e fabricando temporalidade unitária resultante do modo espacial. Em Freud temos resultados diferenciados. Elaborando a noção de representações-limite (Grenzvorstellungen), indicada no “Manuscrito K”, vemos como, ao enfrentar questões com aparelhos detalhados, com suas pinças teóricas delicadas, Freud diz que elas emergem entre afeto e representação. Situadas entre o eu consciente e “uma parte não distorcida da lembrança traumática”, sua intensificação é que produz o recalque. Por exemplo, quando Freud entende o recalque como produzido fora do campo espacial, como numa carta a Fliess (de 6/12/1896), onde postula que “a condição da defesa patológica (recalque) é a natureza sexual do acontecimento e sua ocorrência numa fase anterior”. Ou seja, as representações não chegam ao grande complexo unitário que as organizaria retrospectivamente, pois sua emergência devém.
Não têm gênese no interior de um sistema pertinente e único de representações, mas são, enquanto limite (Grenz), fronteira. Logo, fazem-se e refazem-se permanentemente. Não é aqui a ocasião de desdobrar isto, mas relembro que Freud fala da impossibilidade de alcançar um regime integral de interpretação do sonho, pois este está situado entre o simbólico e o corpo: este entre é seu umbigo (sabemos, com vigor, que o corpo vivo não é apenas somático, mas também e sempre incorporal: aprenda-se com a autotomia e a auto-poiésis). Desde a elaboração desta outra vertente de Freud, não há um complexo nuclear único, organizador dos psiquismos humanos, (Kernkomplex) fundado para sempre desde o recalque e que produziria inconsciente. Se tais pontos nodais se fazem sempre por conjunção, tendendo para complexos, as representações-limites são, simultaneamente, pontos emergenciais de coleções que fabricam vazios e lacunas. Mesmo antes de enunciar a inorganização psíquica, aquilo que denominou de pulsões de morte, Freud mostrou que tão importante quanto a significação é o fazer sentido. E que ambos não se recobrem, mas convergem. O Kernkomplex, enquanto sistema de significação, implica em tendências agregadoras (Bindungen), conjunções no regime representacional, segundo Freud; mas os vazios e lacunas lhe impõem desligamentos, disjunções (Entbindungen). Ambos processos constituem, indissociavelmente, o que denominamos de psiquismo inconsciente.
Quanto à clínica, falo adiante de um caso do próprio Freud. Mas ela se remete permanentemente aos acontecimentos que insistem e não apenas aos aspectos estruturados do psiquismo. Daí a importância dos detalhes, como indiquei antes. Há ainda um outro exemplo para se considerar: sabe-se que uma pequena situação clínica produz respostas distintas das remetidas a um representante pulsional. Tomemos uma vinheta de Ferenczi sobre o apaziguamento do medo de uma criança, quando sua mãe a põe a mijar. Não está ligado a nenhum representante pulsional mas nos ensina muito a respeito das tais raízes instintuais da pulsão enquanto fonte e alvo. Considerando o problema de um ponto de vista técnico, tenho um analisando paranóico, de quem todos falam mal e, além das vozes que o acometem, ele se vê observado na rua. Desde algum tempo que os primeiros minutos de nossas sessões se dedicam a um passeio, que começa na sala de espera conjunta de meu consultório, onde estão analisandos de minhas colegas, e se estende em uma volta em torno do quarteirão com cumprimentos aos porteiros e passantes mais conhecidos. Diria que ele mija na rua, passeando acompanhado. Este rapaz já pode ir ao cinema, o que ele não fazia há mais de oito anos, nem só nem acompanhado. É pouco? Isto nunca excluirá as teorizações e elaborações acerca de sua sexualidade, determinada pelos representantes pulsionais, mas estes últimos não são pontos fixos e sim regimes rigorosos. Temo que, se nos prometemos ao exato, acabamos no reino permanente do desamparo e do mal estar, produzindo (má) ontologia. E haja congressos, simpósios e fóruns para falar de um desamparo (Hilflosigkeit) fundante. Elaborar tal teoria me interessa, com todas as suas (e, especialmente minhas) dificuldades.
Percurso: O Sr. tem feito, efetivamente, uma crítica radical do conceito de representação. Quais são, a seu ver, os limites que seu emprego clássico tem colocado para a clínica psicanalítica? Teria a representação algum lugar na psicanálise? Quais são, efetivamente, as conseqüências de sua crítica para o trabalho clínico?
Chaim: No meu primeiro livro sobre psicoses , procurei verificar, de modo crítico, a importância e os limites do conceito de representação na psicanálise. Foucault mostrou como as representações emergem, num certo momento na história dos saberes ocidentais, na medida da intensificação e mistura dos regimes de linguagem, vida e trabalho; e que os saberes chamados “humanos” se constituíram como formas de reduplicação e comunicação desses regimes empíricos. Com Foucault, eu soube que não existe esta perenidade estruturada da representação ou dos significantes (que com Lacan, são uma teoria muito mais refinada, poderosa e interessante do que a das representações), desde uma articulação universal. Em outro regime de elaboração, a obra freudiana o mostrou, definitivamente.
Recordo que também no campo específico da filosofia não existe um conceito unitário de representação. Por exemplo (para falar de um pensador caro a Freud), quando Schopenhauer distingue entre esta e a vontade (a vontade dói, procurando encontrar a unidade impossível, representacional, da vivência), impõe-se uma elaboração trágica do mundo onde a representação não é mais unitária, dilacerada por forças que desconhece. Daí a dificuldade de nomear estruturas exatas, pois devemos postular organizações rigorosas. Por exemplo, com o conhecimento dos estados intermédios ou limite (borderlines), onde as “estruturas” psíquicas não dão conta das trajetórias do desejo único. Ou quando os psicóticos pedem que a psicanálise dê conta de seus psiquismos: afinal, não dá para produzir psicanálise em negativo o tempo todo, postulando apenas que o psicótico é o que não “realizou” o complexo paterno ou o Nome-do-Pai.
Qual o lugar da representação quando pode ser diferenciada no divã? Ou então, tomando-se as representações desde uma teoria unitária dos representantes da pulsão, o que há a esperar psicanaliticamente de um psicótico? O que se faz com os sofrimentos disruptores e excessivos dos psicóticos? Ou do melancólico Maurício? Desde essa teoria, mesmo no Freud da metapsicologia, os psicóticos não alcançam, não perfazem o complexo. Por outro lado, quando a representação se diferencia clinicamente, quando ela é que está no divã (e não sua teoria prévia), temos muito a psicanalisar. Ou seja, no campo psicanalítico, a força da representação se diz melhor no divã, na situação analítica do que na sua exclusiva teoria. A teoria está presente, mas não na presença da representação.
Explicitar isto com a unidade das representações em torno de um complexo maior, as psicoses como tentativa de suplência do falo, como tentativa de dizer a verdadeira “origem do desejo” é bem medíocre para o saber que se propõe a fundar o psiquismo inconsciente, já que nada resulta clinicamente de tal teorização. Pois tudo e qualquer coisa cabe neste mesmo saco, como se a vontade pudesse ser contida topologicamente: já li vários textos psicanalíticos acerca de arte que diziam que esta tem a mesma função, de suplência fálica.
Existem concepções que supõem o psiquismo inconsciente constituído desde sempre, uma plenitude de representações (representantes absolutos) das pulsões) que chama os indivíduos a entrarem nela a fim de se constituírem enquanto sub-jacentes, assujeitados. Pressupondo a formação dos sujeitos unicamente desde sua inscrição em algo que, sendo deles inteiramente Outro, os constitui absolutamente. Ou seja, nada haveria no incorporal subjetivo que também constituísse este radicalmente outro, pois sujeitos seriam determinados apenas pelo Outro. Desta perspectiva, o que se trata é revelar este Outro prévio, determinar suas mediações com a entrada na constituição do psiquismo. Isto implica no cancelamento dos regimes expressivos do humano e de suas temporalidades diferenciadas, do apagamento dos poderes do corpo vivente, paralelo ao enunciar de um lugar unário onde só se pode ser de um único jeito e pensar de um mesmo modo. Postula-se que o “inconsciente só se exprime por deformação” deste locus, pensamento demasiado religioso (re-ligare) para um judeu laico. (Re-ligare: tornar a ligar. É assim que o psicanalista Hélio Pellegrino, homem religioso, chamava o principal alvo, (Ziel, das religiões, tornar-a-Deus).
De minha parte, afirmo que é preciso pensar também nos regimes psíquicos de criatividade e de como elaborá-los clinicamente. E se indagar se os corpos nada podem, se não são necessários corporais para fazer mundo. Por último, entender as representações fora de seu caráter universalizante é lhes dar um valor maior, limitado e rigoroso, muito mais importante para a clínica analítica.
Percurso: Em seu artigo “Sobre a efetividade da cura em psicanálise”, o Sr. se atém constantemente a diferenças entre as noções de sentido e significação. Há momentos em que elas parecem opostas, como quando o Sr. escreve que a significação é “um sistema simbólico único, geral e totalizador que daria conta de todos os processos psíquicos e que se geraria e faria gerar um tempo único” enquanto “os ‘efeitos simbólicos’ (no paciente em questão) são parciais, referidos ao sentido e não à significação”; há outros momentos em que sentido e significação parecem ser dimensões diversas de um mesmo processo, como quando o Sr. nos descreve a elaboração “da ordem do sentido” feita pelo paciente durante sua cura, que permitiu a ele, da perspectiva dos afetos, criar e sustentar “distâncias psíquicas” e, “da perspectiva das representações (ou significantes-significados) (….) se mostrar apto a (…) deslocá-las em outros regimes temporais”. O Sr. poderia nos esclarecer quais as diferenças que estabelece entre sentido e significação?
Chaim: Acredito que indiquei algumas linhas disto no comentário à questão 7. Acho que ambos se incluem e se excluem. A significação se dá em sistema, ou seja, num conjunto de termos ou categorias que se remetem mutuamente, que têm simetria, estabelecem relações que são mutuamente referidas, permutáveis e, por isto, operacionalizáveis e até previsíveis (conforme Lévi-Strauss). Nunca se referem a acontecimentos, mas a organizações de categorizar: seus termos ou conceitos são não apenas permutáveis mas simétricos e inter-traduzíveis. Não há evidências fora de sistema e o sistema da significação possui uma lógica que o rege e determina (só a lógica corrige a lógica; lógico, não?). Bem, como a significação se estabelece através da produção de um tempo unitário (como o é o a posteriori, a Nachträglichkeit de Freud), de algum modo ela transcende o que ela própria conjunta (na melhor das hipóteses, enquanto transcendental em Kant: condições, limites e possibilidades de um objeto do conhecimento) e explicita e inclui o que parece estar em sua exterioridade. Se vocês estão de acordo, observarão como a lingüística saussuriana serviu de modelo optimal para o pensamento da significação, na medida em que fez do par significante-significado a única articulação possível dos signos, ignorando os referentes. A significação nascendo unicamente no plano lingüístico (e, na psicanálise, linguageiro), o extra-lingüístico só se faz sentido incluído (e “convertido”) no mundo único da significação.
O sentido se refere ao regime de imanência. Pelo menos um princípio espinosista está aí presente: uma só substância para todos os atributos. Se os corpos se encontram, produzem relações que são incorporais. Tais relações são sentidos, mas não têm relações diretas com os corporais que as “geraram”. Se o que se encontra é concreto, a resultante do encontro é incorporal e abstrata e, principalmente, múltipla. No regime da significação as resultantes são tomadas como elementos prévios aos encontros, perdem sua capacidade de força (pulsão sem força!) e são elaboradas como lógica que obriga os fatos. Imanentemente, os encontros produzem sentidos que são sempre múltiplos e variados. Cada singularidade tem, então, sentidos diferentes e os atributos são sempre múltiplos.
Ocorre que Freud (e eu também) é menos otimista do que Espinosa, na medida em que postula que a morte também é conatus, que a morte persevera no humano disjuntivamente, fabricando permanentemente inorganizações (CSK). Aprendi que o sentido se impõe inúmeras vezes, de maneira dispersa; por isso é confusamente produzido. Não apenas pela incidência permanente das pulsões de morte, mas por encontros que não insistiram para o si, que não se organizam por referência a atributos que possam pertencer-lhe desde os encontros corporais. Os psicanalistas, diferentemente dos filósofos, não acreditam que qualquer encontro se enquadre na corrente ontológica adequada: o mal existe e é constitutivo do psiquismo. Também em psicanálise, distintamente da fenomenologia de Husserl, fazer sentido é insistir, é apropriar-se, apoderar-se, no sentido estrito de Freud, que nos ensinou acerca das pulsões de domínio (Bemächtigungstriebe).
Ora, para produzir um caso psicanalítico, precisa-se de um regime de significação, pois a teorização nos remete constantemente à ordem da significação, paradoxalmente. Mas o mesmo o fazem os psiquismos humanos, por mais distintos que sejam: produzem significação ao mesmo tempo em que insistem no sentido. Mostrei, em meu livro sobre as psicoses em Freud, que no caso de confusão alucinatória que ele examina, isto se faz de um modo específico, postulando que há a separação de um pedaço de realidade psíquica que tem uma lógica e um andamento próprios. Mas há que articular as representações que constituem tal Stück der Realität, diz Freud. É ele quem postula, no caso da moça a quem o rapaz “fez mal” e que o espera sempre vestida de noiva (1894 a, “As neuropsicoses de defesa“), a gênese de seu delírio por referência a um desengano amoroso. Afirma a existência de um trauma sexual (o impulso sexual, as tendências da moça) na gênese das representações insuportáveis, mas não elabora como este momento genético se articulou com os outros “momentos secundários”, investigando apenas as relações deste “pedaço” com o Eu. Contudo, para alguns psicanalistas comentadores desde uma teoria exclusiva da significação, será este “pedaço de realidade”, além de objeto de estudo, o ser único a constituir o psiquismo da noiva. De modo diverso, eu me dediquei a pensar, juntamente com outros psicanalistas, que Freud estudou também seu sentido e procurou curá-la, tirando-a do delírio, devolvendo-lhe indiretamente um tipo de conhecimento sobre ele. O “pedaço de realidade” não se confunde com seu psiquismo, que é múltiplo e variado, mas tal “pedaço de realidade” persevera psiquicamente. Deve-se fazer deste pedaço e do seu suposto predomínio uma significação absoluta, o rochedo da castração que fomenta o psiquismo?
Retomo ainda mais um relato de Freud, também elaborado por Fédida em direção similar. Freud relata como Cäcilie M., a baronesa Anna von Lieben, teve uma alucinação: seus dois médicos, Breuer e Freud, estavam enforcados (aufgehängt), pendurados em duas árvores, próximas uma da outra, no jardim. Cäcilie pedira um remédio a Breuer, que o negara; depois pediu a Freud, que também não o deu. A alucinação, mostra Freud, diz respeito a que um é correspondente do outro: “Ambos se equivalem, um é pendant do outro” (GW I, p. 251). A experiência do sentido, da memória não-simbólica, não se inscreve agora e se determina como alucinação, onde não há remetimento mútuo de representações, mas como encontro expressivo de experiências pulsionais. Estas experiências, sua abordagem no registro de um tempo não-recorrente não as deixa que se inscrevam simbolicamente.
Trata-se, neste exemplo, de um acontecimento não-representado, fora de uma “tendência à associação”, diz Freud, não inscrito desde um sistema prévio, pois não diz respeito à memória contínua do a posteriori. Mas que faz sentido, alucinatoriamente. Neste caso, e segundo Freud, a alucinação não é um resto mal realizado ou uma tentativa de chegar a um complexo finalizador, mas afirmação pulsional (Freud afirma que a interpretação do acontecido suprimiu a alucinação, o que se discutirá em outra ocasião; o porquê dessa experiência de sentido ser alucinatória é bastante mais complexa e também não cabe aqui, acho).
Tais indicações nos remetem a outra teorização, do próprio Freud. No início ele pensou que aquilo que constituía o trauma, o que ele chamou de “excitação original”, poderia ser descarregado pelo trabalho de pensamento. Mas se deu conta que nem todos os afetos podem ser convertidos e que fica sempre um quantum de energia, que impossibilita as representações de se associarem adequadamente. Por exemplo, para o caso da histeria, com conseqüências mais diferenciadas do que posso fazer aqui, ela não se deve a lacunas nas representações, como o pensa uma teorização também importante, mas à mistura de quantidades heterogêneas incapazes de se inscreverem sistematicamente. Encontrar o sentido para a intensidade afirmativa é distinto da busca de uma significação que homogeneiza tais quantidades diferenciadas. São atividades e pesquisas distintas, “permitidas” pelas formações diferenciadas do psiquismo inconsciente e suas memórias múltiplas.
Percurso: O Sr. faz uma importante crítica à psicanálise que pensa o complexo de Édipo como estrutura. O Sr. parece considerar o Édipo como uma das configurações afetivas possíveis. Seria importante o Sr. expor um pouco essa sua posição. Isso não pode levar a um trabalho que apenas se nomeia psicanalítico mas que se distancia cada vez mais de Freud?
Chaim: Vejamos. Inexiste a elaboração e até mesmo a nomeação de Freud acerca de complexo nos Três Ensaios, texto básico para uma teoria específica das pulsões; contudo, isto não o afastou de sua própria teorização. Freud elaborou, na medida em que visou detalhar objetos teóricos diferenciados, vários regimes de construção teórica. Mas, a emergência de “complexo” em sua obra tem uma dívida profunda com o modo psiquiátrico de pensar, especialmente com o pensamento de Jung. Complexo, do verbo depoente (forma passiva e significação ativa) complecti, é abraçar, abarcar. Emerge com o psiquiatra Kahlbaum (um kantiano) e suas síndromes, (Symptomenkomplexe). Ou seja, desde sua nomeação, através dos complexos, trata-se de verificar um quadro abarcador e não elementos separados; tais síndromes, constituídas de elementos fisiológicos, seriam totalizados psicologicamente. Jones, na sua biografia de Freud, diz que o significante “complexo” e os testes, derivados do método de associação (Jung), usados enquanto categorias psiquiátricas, foram introduzidos pelo neurologista Theodor Ziehen, o mais famoso psiquiatra de Berlim da época. Aprendemos que com o apelo aos complexos, Freud, procurando uma totalização dos fenômenos psíquicos, abandonou parcialmente os impulsos e o quantitativo-qualitivado na elaboração dos casos clínicos, dos instintos ou das pulsões. Freud precisou romper com os quadros descritivos do sintomas. Postulando a castração enquanto princípio único da diferença sexual, uma proto-fantasia original universal elaborada no modo complexo, ele chegou à elevação de uma única categoria e do primado unitário da significação.
Como indiquei com o próprio caso clínico de Freud (Cäcilie M.), tal totalização elimina elaborações parciais, também importantes na obra freudiana. Freud persegue , tenazmente, a estrutura unitária do complexo de Édipo. Apesar de suas intensas diferenças, lembro de Totem e Tabu e Psicologia das Massas e Análise do Ego, onde procura estabelecer seus fundamentos. Contudo, na medida em que penso a diferença entre significação e sentido na obra do vienense, tenho para mim que Mal estar da cultura e Futuro de uma ilusão (bem como, antes deles e de modo incisivo, Para além do princípio de prazer) elaboram a inexistência de um complexo totalizante e não são a afirmação do desamparo enquanto lugar ideal.
Tal elaboração é distante de Freud? Sempre tomo cuidado (ou penso fazê-lo) com o pensamento do mestre. Assim, levando em conta a tendência (Neigung, disse Freud, clinamen, diria Lucrécio) do pensamento inconsciente de buscar conjunções, chamo os resultados que se produzem desde tais processos de “pequenos édipos”, sem “complexo” totalizador. A interpretação da maioria dos psicóticos se inscreve na parcialização do sentido e não na totalização de algum complexo. Pois o “complexo” se perguntará sempre pelo que ficou fora dele, o que não se inscreveu e os porquês da não-inscrição. Ou seja, recusa do sentido (porque negativo) e afirmação simultânea da totalização. Insisti, durante esta entrevista, que o fazer psicanalítico se estabelece na relação incorporal inconsciente do corpo do indivíduo com suas experiências de sentido, e se constitui também numa história significacional onde se expressa o registro trágico do sujeito. É assim que postulo a possibilidade e também os limites do complexo de Édipo.
Percurso: Em seu livro Freud e as psicoses o Sr. afirma que, para uma leitura positiva da psicose não poderíamos contar exclusivamente com a psicanálise. Com o que mais precisaríamos contar, desde seu ponto de vista? O que seria, para o Sr., o “tratamento com psicóticos”? Como o Sr. pensa a questão da psicose na interface psicanálise-instituição?
Chaim: Penso que disse que devemos contar com a psicanálise sexualizada que não procura atingir a constituição do psiquismo inconsciente unicamente através do complexo de Édipo, o que me parece bem diferente. Quanto à palavra “exclusivamente”, em 1999, o que significa, no âmbito das práticas e teorias? Ora, a maioria dos teóricos psicanalíticos desclassifica as afirmações positivas acerca das psicoses, mostrando-as sempre como produtos inacabados ou mal-realizados: as psicoses seriam “o que não é edípico”. É pouco, mas é confundido com o que seria a psicanálise. No exemplo do Sr. N., procurei indicar como é um tratamento psicanalítico com psicóticos. Bem como o fiz no caso Marcelo, citado anteriormente (conforme nota 3) .Quanto à última colocação, penso, como muitos de meus colegas, que as instituições temem aquilo que não é homogêneo e equilibrado. E assim caminham para postular regularidades e totalidades, fabricando “produtos” que não fujam de seu domínio ou, pelo menos, alcance. Aprendi muito com Foucault acerca dos caminhos que a loucura “teve” que percorrer para se tornar problematizável para as psicologias e a psiquiatria, a produção de uma pólis moderna com suas instituições e regularidades, sua inclusão num mundo homogêneo de noções e categorias, de campos equilibrados de pensar o ser do homem etc., na sua exclusão da socialidade normal e a inclusão nas instituições reparadoras, para poder existir enquanto “doença mental”. Além de sua prozaquização contemporânea, claro. Contudo, o mais importante para mim, no pensamento e nas vivências, no âmbito limitado em que vivo e me afirmo, é a postulação de Freud acerca da positividade do delírio e da loucura. Permitam-me pequena citação, quando Freud identifica similitudes “estruturais” entre sua teorização e os delírios de Schreber, tais como expostos nas Memórias: “Deixo ao futuro decidir se na teoria [psicanalítica] cabe mais delírio do que eu queria, ou se no delírio [cabe] mais verdade do que outros acreditam hoje possível” (GW VIII, p. 315, meu grifo). Apesar da psicanálise ter desleixado os ensinamentos da paixão (como quer André Green), um apaixonado como Freud se pergunta se o Outro lhe é sempre e tão radicalmente diferente.
Percurso: A psicanálise tem instrumentado o Sr. na sua reflexão sobre o contemporâneo? Como é isso? A sua indagação sobre a solidão (nota 5) tem a ver com a inserção da psicanálise no mundo de hoje?
Chaim: O que é contemporâneo, em 1999? Teorizar sobre as topologias ou instâncias psicanalíticas ou pensar também no pólemos psicanalítico para se afirmar na vida social e cultural? Quando me escolheram para o diálogo, não deviam ignorar meu lugar na produção contemporânea brasileira. Desde meus escritos, até minhas lutas políticas. Desde 1966 tenho estado junto aos meios de comunicação de massa, de modo desavergonhado, respondendo a questões que vão da psicologização da vida cultural brasileira até a máscara e a Unheimlichkeit da Tiazinha. (Unheimlichkeit: in-familiaridade, assunto central do ensaio de Freud acerda daquilo que, mesmo sendo recalcado, se apresenta enquanto imediaticidade, provocando o horror (Freud 1919h Das Unheimliche. “O infamiliar” GW, XII). Tinha listado cerca de 250 conferências e debates sobre temas ligados à psicanálise, o que é um excesso… contemporâneo, que não mais cometo. Escrevi sobre Caetano e Chacrinha, na década de 70, quando também pensei e escrevi sobre psicanálise e marxismo. Fui preso político em 1971, o que hoje nada significa. Em 74, publiquei o primeiro livro brasileiro sobre psicanálise e instituição; posteriormente, escrevi acerca das questões de poder e desejo; redigi, em 85, o único livro brasileiro sobre as relações dos psicanalistas com o nazismo , sem a menor repercussão, aliás. Fui presidente e um dos organizadores do grande Congresso de Psicanálise e Instituição, no Rio de Janeiro, em 1978, com vinte e dois convidados internacionais e mais de dois mil pagantes. Seria isto uma reflexão? Hoje, quero-me menos contemporâneo.
Solidão: a psicanálise contemporânea, grosso modo, abandonou a afirmatividade narcísica (como ensinou Ferenczi), pensando a solidão como categoria narcísico-patológica, doença do isolamento e do autismo. Ou seja, o sujeito imerso num mundo “seu”, recusando contato e comunicação. Tal “psicanalês” me é insuportável. Escrevi o ensaio sobre a solidão para mostrar sua positividade. É claro que me foi importante conhecer a obra de Winnicott, para quem a solidão é uma capacidade que se conquista, e a de Dolto, que pensa a solidão como processo. Meu livro não é psicanalítico e sim escrito por um psicanalista.
Percurso: O que é possível constatar na leitura de seus textos é que, contrariamente ao que se faz usualmente em psicanálise, o Sr. nunca deixou de pensar politicamente a psicanálise. Em vez de psicanalisar a política, o Sr. politiza a psicanálise. Como é isso?
Chaim: Por um lado, é preciso mais paciência do que tenho, para psicanalisar a “vida social” (o que quer que isto seja) com categorias universalizantes produzidas desde o linguajar psicanalítico: a guerra é uma invasão paterna contra territórios maternos (em alemão, Mutterland), a velocidade na corrida de carros é um ultrapassamento de barreiras e limites, deste tipo são os exemplos que colhi, em grande número, na pesquisa exaustiva do Internationale Zeitschrift für Psychoanalyse ou na Imago. Ou o falo como o locus para onde tudo deriva, desde que não saibamos elaborar o tal “tudo”, é claro. Uma boa exceção é Fenichel, cuja obra começo a pesquisar no fim do ano (para que? pela paixão?) É preciso distinguir entre a psicanálise política e o político da psicanálise. A psicanálise tem direções nos seus regimes de força, que não obedecem aos regimes representacionais. Talvez seja importante psicanalisar a política, mas é preciso considerar a afirmação política da psicanálise, como ela devém, aquilo que é construtivo psicanaliticamente na vida social, seu político.
Por exemplo, acho que se devem considerar as produções psicanalíticas desde sua efetividade, ou seja, como podemos ser psicanalistas no Brasil sem clientela, sem procura. Sem clientes, demanda, procura, burocracia etc. há psicanálise? Outro exemplo, o que é ser analista aqui, isolado, enquanto atividade profissional, pois estamos decididamente fora da atual revolução biotecnológica e dos viagras? O que têm os psicanalistas a dizer, a não ser que os humanos se destinam ao mal estar e que se devem evitar os atalhos (prometidos pelos biopsíquicos) para diminuí-lo? Acho também que é preciso considerar os lugares em que a psicanálise emergiu, com seu vocabulário e regras pertinentes. Interessa-me saber por que e como a psicanálise brasileira se efetivou durante o regime militar e se o pensamento psicanalítico que se impôs, com sua neutralidade discursiva, não serviu de modo indireto aos interesses de tal regime, na medida em que se propôs pertinentemente. O chamado “boom” da psicanálise não pode ser compreendido sem tal questionamento. A partir disto, acho que a investigação sobre técnica e clínica fica diferenciada.
Outro exemplo, uma certa linha paulistano-bioniana de interpretar atrasos nas sessões como transferenciais, mesmo quando São Paulo pára por causa de engarrafamentos ou inundações, além de ser delirante, parece-me que é uma produção do político da psicanálise, como se esta fosse um ens causa sui (ente causa de si mesmo, Deus). Isto é produto do político da psicanálise e não de sua politização. Penso que estou no limite “entrevistacional” proposto, mas são outras questões que me despertam.
Percurso: O Sr. acompanhou algumas experiências importantes que procuraram estender o acesso da psicanálise às camadas menos favorecidas da população – a Clínica Social, levando em conta que a psicanálise é também uma inscrição e produto social. Gostaríamos que nos contasse um pouco como o Sr. vê, hoje, essas experiências, o que resultou delas, quais suas contribuições para a psicanálise.
Chaim: Sob a direção de Kathrin Kemper e Hélio Pellegrino, psicanalistas muito importantes no Rio de Janeiro e na minha trajetória, estive no grupo fundador da Clínica Social de Psicanálise, em 1973. Era um modo de fazer da psicanálise “uma inscrição e produto” sociais importantes. Atendemos inúmeros grupos que, de outro modo, jamais teriam acesso à clínica analítica. Mas também fomos procurados por pessoas que se aproveitaram da oferta de baixos preços. Muito importante foi a autorização que nos demos de ser psicanalistas enquanto “Clínica Social”, o que nos colocou produzindo coletivamente. Contudo, faltou-nos uma pesquisa psicanaliticamente elaborada sobre como e a quem atendíamos e acerca do estatuto da psicanálise; ficamos, muitas das vezes, no campo reativo. Tivemos entusiasmo e reconhecimento, sem o devido conhecimento e cuidadosa elaboração. Mas a Clínica Social foi um elemento importante para muitos atos analíticos e para a difusão psicanalítica, uma oposição à hegemonia da IPA e uma afirmação pública e pensada de psicanalistas contra a ditadura militar e disto nos orgulhamos. Experiência limitada, mas importante.
O que aprendi? O lugar das empregadas e governantas na obra de Freud me ensinou que o complexo de Édipo não é universal…
Percurso: Onde o senhor encontrou essa idéia na obra de Freud?
Chaim: Quando Freud examina Lucy, a governanta que tem sintomas de anosmia e cacosmia “porque está apaixonada pelo patrão, sem ser correspondida” (segundo a teoria freudiana da época), ao mesmo tempo em que se encaminha para postular uma teoria do complexo nuclear (Lucy recalcou a pulsão amorosa, que se substituiu pelos sintomas), ele lhe dá uma solução teórica para sua resolução, que muitos se esquecem de elaborar. Assim, no último diálogo de Freud com Lucy, ele lhe diz, a respeito da gênese de seus sintomas: “E a senhora ainda ama o diretor?” Ao que ela responde: “Certo que o amo, mas isto não me importa mais. Pode-se pensar e sentir o que se quer, em particular.” (GW I, p. 180). Ou seja, na construção da via edipiana se exportam ou deportam possibilidades que não se incluem como discursivas e regulares, duradouras no tempo cronológico socialmente válido. O que deve uma empregada, a não ser saber a gênese de seu sintoma e cessar seus investimentos?
Explico. Qual o lugar das empregadas, babás, governantas enquanto termos psicanalíticos? Se podemos pensar que a psicanálise se estruturou em torno de três formas mais importantes de questões (a diferença sexual; a estrutura familiar e a proibição do incesto; o sistema de nomeação e o nome próprio) qual o lugar, o topos que se dá a estas figuras auxiliares? Há uma exclusão de tais personagens e suas funções, tão importantes na economia psíquica dos analisandos de Freud. Penso que a enunciação teórica do complexo de Édipo só é possível se se excluem tais regimes de figuras laterais e cronologicamente passageiros, sem relação de herança e posses, nomes e parentescos, ou “menos importantes” da produção libidinal. Acho também que a psicanálise se construiu ao preço de tal fronteirização da discursividade, valorizando unicamente os termos familiares e libidinais que constituem as normas e regras de um certo grupo social (certamente o que mais importa até hoje à psicanálise), produzindo tal fechamento de linhas enquanto leis. Aprendi isto lendo Freud criticamente (como nos ensinou Kant), mas especialmente ouvindo os limites de nosso saber e técnica quando os demandantes moram em morros ou em quartos de empregada. E aprendi, incisivamente, lendo, entre outros, Clarice Lispector (A Hora da Estrela).
NOTAS
- Chaim Samuel Katz, Ética e Psicanálise; uma introdução, Rio de Janeiro, Graal, 1984.
- C. S. Katz, Freud e as Psicoses , RJ, Xenon Editora e Produtora Cultural, 1994
- C. S. Katz, “Sobre a efetividade da cura em psicanálise”, in: Cultura da Ilusão – textos apresentados no IV Fórum Brasileiro de Psicanálise, Set./1997
- Pierre Fédida, Nome, Figura e Memória – a linguagem na situação psicanalítica, SP, Escuta, 1992
- C. S. Katz, O Coração Distante – ensaio sobre a solidão positiva, RJ, Revan, 1996
- C. S. Katz, Psicanálise e Instituição, RJ, Documentário, 1997
- C. S. Katz, Psicanálise, Poder e Desejo, RJ, Coleção IBRAPSI 1, 1979
- C. S. Katz, Psicanálise e Nazismo, RJ, Taurus.